terça-feira, 14 de outubro de 2025

Ensaio das Andorinhas

 

    As folhas dão mostras que se aproxima o fim. Essa cor dá-me sempre uma espécie de aperto, um grito sufocado na partida. Mas ainda há sol e luz, e dentro da sala os raios entram firmes e decididos. Subitamente um jogo de sombras orquestradas fazem música nas paredes. Parecem aves gigantes, quiçá vigorosos dragões! São asas leves, velozes e gentis, há harmonia no seu voo e o jogo de luzes e sombras é aprazível: esperançoso.

Sou arrancada da mesa de trabalho e vou até à janela espreitar a varanda: são andorinhas. As andorinhas vêm num bailado anunciar a sua despedida. Mas, por enquanto, elas estão cá e brindam-me com essa dança, uma ode à vontade.

O tempo: o relógio tira-me do meu transe, por momentos estava viva com a minha música e a pintura das palavras que se vertem sobre o espelho de água. O Tâmega está sereno e todas as coisas me abraçam. Nenhuma das serras me prende, mas eu afago-as como doces mantas em manhã frescas de outono. Respiro, estou bem. É certo, as andorinhas vão partir. Mas, este, só este, é o momento de agora e o presente, e as andorinhas voam, porque podem ir onde quiserem, voam felizes aqui, grandes leves, graciosas e vigorosas como dragões prateados ou cavalos alados.


E o relógio volta-me a arrancar à vida – por momentos eu vivi, abraçada à mãe serra, à mãe água, à mãe terra… ao paraíso que está lá fora.

A Lúcia

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