sexta-feira, 27 de março de 2015

A que preço está a vida?



A que preço está a vida?
Se a bela flor do campo que deste ar respira
Vive, vive, vive sujeita ao mesmo pranto
Que qualquer outro ser que respira…
A que preço está a vida de qualquer ser que é gente
Se para viver só se respira este ar que é de quem o sente?
Porque se paga imposto de gente a gente que não é gente?
Porque se paga imposto de vida e vivesse pior que a formiga?
Quando a vida é só vida,
Disponível,
Inatingível,
Sacra transcendente
Vulgar e transeunte.
Quanto custa a vida, a que preço está a gente?

Lúcia Cunha
7-04-2014

segunda-feira, 2 de março de 2015

UM POEMA CLARO PARA TI



Se eu pudesse
Fazer o que fazer queria
Deitava-me sobre tudo
Sobre o leito
Em deleito de poesia
E qualquer dia vou-me a ti de corpo inteiro
Para ser clara, clara, clara água do riacho
Sons nítidos deste vale, chocalhar da água na rocha
Não vejo em ti uma ponta de mal
Não sou fera nem besta nem asno que amocha
Não sou luz, lucerna ou lucero nem fogo nem tocha…
Mas deixo-me “do pensar”
E pego no teclado para amar
E qualquer dia vou-me a ti
De corpo inteiro
Ao teu corpo.

Se eu pudesse fazer o que fazer queria…
Vou-me a ti qualquer dia
E ponho a minha vontade em dia
Vou-me a ti qualquer dia
Fazer o que te fazia
Beijos no dorso colosso
Se eu pudesse ser terra seria barro rosso
Barro rosso
E fazia da papoila
A flor da minha poesia
Ah se fazia, fazia…
Fazia azia
Na barriga da burguesia
E era indigesta
E cortante como a vergastada da giesta
Mas farei.
Qualquer dia.
Mas farei qualquer dia.

Riprende



Esgotei as palavras
Esgotei as lágrimas
Resta-me respirar
Esgotaste a Musa
Rasgaste-me a blusa
Rasgaste-me a alma
Tiraste-me o equilíbrio
E o ponto de calma
Só te resta abandonar.

Abriu-se a terra e o mundo engoliu o fundo.

Abriu-se o corpo e foi eterna a ferida
Aberta a saída num golpe profundo
Retira-me o lugar do coração
Retira-me o cheiro do corpo
Este cheiro a cheiro morto
Este cheiro putrefacto
Só me resta respirar
Só me resta respirar.

Respira
Riprende
Andiamo ragazzina mia, riprende di questa tormenta.
Andiamo via
Tu che la fai
Tu che la fai
riprende, riprende… io riprenderò
Respira, respira respira respira
Tosse expulsa nasce.
Tosse expulsa e nasce.
Nasce.
Nasce a cada batida deste teclado
Nasce meu bem ser meu bem ser, ser amado
Nasce do corpo do ventre da terra ser enlameado
Nasce, nasce ao som do batucado
Nasce, nasce da terra
Neste dia nublado e frio
Sinto já cheiro a vazio
E o eco do ritmo
E o claro som do rio
São claros e nítidos
E decerto quase belos
Os gritos dos pássaros
Os remos solitários dos dispersos batelos.