As folhas dão mostras que se aproxima o fim. Essa cor dá-me
sempre uma espécie de aperto, um grito sufocado na partida. Mas ainda há sol e
luz, e dentro da sala os raios entram firmes e decididos. Subitamente um jogo
de sombras orquestradas fazem música nas paredes. Parecem aves gigantes, quiçá
vigorosos dragões! São asas leves, velozes e gentis, há harmonia no seu voo e o
jogo de luzes e sombras é aprazível: esperançoso.
Sou arrancada da mesa de trabalho e vou até a janela espreitar
a varanda: são andorinhas. As andorinhas vêm num bailado anunciar a sua
despedida. Mas por enquanto elas estão cá e brindam-me com essa dança, uma ode
à vontade.
O tempo: o relógio tira-me do meu transe, por momentos estava viva com a minha música e a pintura das palavras que se vertem sobre o espelho de água. O Tâmega está sereno e todas as coisas me abraçam. Nenhuma das serras me prende, mas eu afago-as como doces mantas em manhã frescas de outono. Respiro, estou bem. É certo, as andorinhas vão partir. Mas, este, só este é o momento de agora e o presente, e as andorinhas voam, porque podem ir onde quiserem, voam felizes aqui, grandes leves, graciosas e vigorosas como dragões prateados ou cavalos alados.
E o relógio volta-me a arrancar à vida – por momentos eu vivi, abraçada à mãe serra, à mãe água, à mãe terra… ao paraíso que está lá fora.
A Lúcia