Em passos leves
Toco o chão de terra
Há quanto tempo não te chamo,
Como chamava antes?
não abandonei
Mas eu hoje sei
Que estive sempre
Só
Como mais um ramo dos caules
Ínfimo grão das areias
Breve fio das teias
Chamo no orvalho
No frio
Na secura do deserto
Chamo e não sinto perto
Como se a terra partisse de mim
Admiro da pequenez
E encosto-me a teu peito até que me queiras absorver para teu
ventre
Terra minha de onde nasci.
Perdem a doçura as palavras
E o vento levou as melhores frases por nascer
E eu passei quase meia vida
neste modo de desviver
Desventram-te.
Secou-me tudo como te secam a ti as fontes
a mim, me secaram as frontes
Vento árido.
Levam em pedaços os rochedos
As rajadas aos poucos
E eu que perdi os meus medos
não tenho voz
nem vós me tendes segredos
E para quê? Para quê saber a verdade?
Sei-a desde sempre
Não que isso traga felicidade
o segredo, sempre foi
sorrir e manter a idoneidade
Ser terra ser tu, barro do barro
Seiva do caule
Fogo o mal
Musgo e giesta, meu corpo floresta
ventre vale, sulco e
mar
flor bolbo botão brotar
mover viver mudar
e o tempo imenso colossal
enorme envolve e dorme.
exígua ou insigne preponderante
a eternizar
só uma areia no areal.
Lúcia Cunha
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